Agressão de Datena a Marçal desvirtua debate mais focado em conteúdo até aqui

O formato proposto pela TV Cultura para o debate entre os candidatos à prefeitura de São Paulo teve certo êxito em fazer com que o encontro trouxesse mais sobre propostas para a população e menos sobre xingamentos e provocações. Mas não foi suficiente. No quarto bloco, o embate, iniciado no encontro anterior na TV Gazeta, terminou com uma agressão do apresentador José Luiz Datena (PSDB) ao influenciador Pablo Marçal (PRTB) com uma cadeira.

Os dois protagonizaram uma das cenas que vão entrar para a história da política nacional, com candidatos chegando às vias de fato em rede nacional após provocações e trocas de acusações. Tudo isso, porém, fez mais uma vez o programa ser mais sobre os candidatos e suas ações, e menos sobre a cidade.

Infelizmente perdi a cabeça, diz Datena após agressão a Marçal
Marçal diz ser “lamentável” debate ter continuado e que precisou de atendimento médico após agressão

A cadeirada de Datena em Marçal

O embate entre Datena e Marçal começou no segundo bloco, quando o apresentador foi sorteado para fazer uma pergunta para o influenciador. Datena disse que não faria nenhum questionamento para Marçal por causa de sua atuação nos debates anteriores.

O influenciador, então, acusou Datena de ser condenado por crimes sexuais. O caso citado por Marçal foi sobre uma denúncia de janeiro de 2019, feita pela repórter Bruna Drews.

Em uma representação feita no Ministério Público de São Paulo (MP-SP), a mulher alegou que Datena lhe disse que ela não precisava emagrecer pois “era muito gostosa” e que teria dito que era um desperdício ela “namorar uma mulher”.

Datena processou Bruna Drews por calúnia e difamação. Nove meses depois da acusação, ela assinou uma retratação em um cartório de São Bernardo do Campo. Em entrevista ao UOL, em outubro de 2019, a mulher disse que foi “induzida pelos advogados de Datena” a assinar a carta na qual se retratou pela acusação.

Na resposta a Marçal, Datena reforçou que as acusações haviam sido infundadas, e sequer investigadas pela polícia e o Ministério Público.

O tucano, na ocasião, aproveitou para acusar Marçal de seguir sendo um “ladrãozinho de bancos”, em referência ao processo de furto qualificado contra ele, em 2010, no qual Marçal foi condenado mas o crime prescreveu. O influenciador, porém, seguiu com as acusações e ironizou o nome do apresentador como “dá pena”.

No quarto bloco, quando os candidatos voltaram ao embate direto, Datena e Marçal foram novamente sorteados para debater. A agressão aconteceu após Pablo Marçal fazer uma pergunta para Datena, questionando quando ele iria parar com a “palhaçada” e desistir da candidatura.

“Você é um arregão. Você atravessou o debate esses dias para me dar tapa e falou que você queria ter feito. Você não é homem nem para fazer isso. Você não é homem”, disse Marçal.

Datena então deixou seu lugar no púlpito e agrediu Marçal com uma cadeira.

O debate foi imediatamente suspenso por 10 minutos e retornou na sequência, com a expulsão de Datena pela violação das regras e a saída de Marçal, que, segundo a emissora e sua assessoria, foi levado para atendimento médico no hospital Sírio-Libanês.

Três blocos de propostas

Nos primeiros três blocos, o debate destacou as propostas dos candidatos para temas como habitação, educação, saúde e segurança. Isso foi possível, principalmente, pelo formato do programa, que intercalou blocos com perguntas do mediador diretamente para os candidatos com blocos de embate.

Marçal chegou a ser escanteado pelos adversários e não demonstrava o mesmo destaque dos encontros anteriores. Sem chance de embates diretos com Boulos e Nunes, ele mirou em Datena para ter protagonismo no programa.

A deputada Tabata Amaral (PSB) foi questionada sobre o modelo que irá adotar para reduzir o déficit habitacional. Tabata lembrou que a capital paulista tem 80 mil pessoas nas ruas e um déficit de 400 mil moradias. A candidata defendeu um modelo de locação social com a utilização de prédios ociosos no Centro de São Paulo.

Questionado sobre o tema da mobilidade, que envolve poluição e a letalidade no trânsito, Datena falou e tirar “bandido do PCC” de dentro do sistema de transporte coletivo. O apresentador também defendeu a adoção de transporte coletivo elétricos e tarifa zero integral às pessoas de baixa renda.

A economista Marina Helena (NOVO), perguntada sobre segurança, falou sobre o uso de câmeras nas fardas dos Guardas Civis Municipais (GCM). A proposta para a segurança pública da candidata também envolve a ampliação de investimentos na área e “tolerância zero com o crime”.

O deputado Guilherme Boulos (PSOL) tratou da educação, classificando como inaceitável a capital paulista hoje estar 21º lugar na alfabetização da idade certa. O psolista prometeu uma “revolução” que passa pela valorização dos professores, garantir psicólogos em toda a rede municipal e educação integral aos alunos.

O atual prefeito Ricardo Nunes (MDB) respondeu sobre saúde pública, e afirmou ter inaugurado 18 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e prometeu mais 12 UPAS e R$ 20 bilhões para a área, verba que afirma ter em caixa.

O prefeito também chamou atenção para o programa “Paulistão da Saúde”, um complexo de atendimento que pretende implementar pela cidade.

Questionado sobre seu plano para enfrentar os efeitos das mudanças climáticas na capital, Marçal preferiu provocar Datena, afirmando que ele não havia respondido, assim como Nunes. E disse que era preciso reduzir o IPTU de carros elétricos, aumentar a plantação de árvores e proteger os mananciais, sem detalhar as medidas.

Marina Helena, que vinha se alinhando a Marçal e fez dobradinha com o influenciador nos três debates em que participou, também marcou um distanciamento ao afirmar que a direita estava cansada “de ser enganada” e questionar a posição de Marçal sobre o impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, alvo de protesto no 7 de setembro, em que a participação do ex-coach desagradou bolsonaristas.

Boulos e Nunes puxam debate para si após agressão de Datena

Após a expulsão de Datena e saída de Marçal, o debate foi protagonizado por Nunes e Boulos, que aumentaram o nível de ataques e provocações.

O atual prefeito, por diversas vezes, acusou o deputado federal do PSOL de ser a favor da liberação de drogas e também insinuou que o candidato faria uso de drogas, como atacava Marçal.

Boulos, por sua vez, também alfinetou o prefeito sem citá-lo, ao afirmar que “não tem patrulha Maria da Penha em Interlagos, onde mora o prefeito, e faz falta”. A fala aconteceu durante resposta do psolista à Tabata sobre medidas contra a violência doméstica contra as mulheres.

Nesse sentido, Boulos buscou lembrar de um Boletim de Ocorrência registrado pela esposa de Nunes, Regina Carnovale Nunes, em 2011, acusando o prefeito de agressão. A queixa depois foi retirada pela mulher, que nega a acusação.

O debate, que até então tinha poucos pedidos de direito de resposta, registrou uma sequência de quatro pedidos por ataques entre os candidatos.

Candidatos lamentam agressão

Ao final do debate, Tabata e Marina Helena lamentaram o nível do encontro, que vem numa sequência de ataques com completa ausência de discussões propositivas sobre a cidade.

Ao também lamentar os acontecimentos, como uma “perda para a nossa democracia”, Nunes se solidarizou com Datena, afirmando que o candidato do PSDB “foi provocado e tentou defender a honra de sua sogra”.

Boulos também citou “o nível baixo”, “a dificuldade de discutir propostas” e criticou a gestão Nunes para defender que os episódios devem “servir de lição” para que a cidade tenha outro caminho de compromisso com povo, respeito e democracia.


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