Além do crachá: executivos fortalecem marca pessoal nas redes sociais e alavancam negócios

Você já deve ter percebido que cada vez mais executivos e executivas estão se posicionando em redes sociais como LinkedIn e Instagram com posts opinativos sobre assuntos relacionados às suas áreas de trabalho. Não é só impressão. Profissionais de média e alta gerência perceberam nessas plataformas uma vitrine para ampliar suas vozes.

Só que é preciso um certo cuidado com essa exposição. Afinal, é a sua marca pessoal exposta ali. “É superimportante que cada profissional saiba qual é o seu diferencial”, afirma Susana Arbex, sócia da BetaFly Brandmakers e coautora do livro “Sua Marca Pessoal“.

Para ela, o tema de “pensar-se como uma marca” vem se tornando importante nos últimos anos e nos últimos dois se tornou crucial. Principalmente em razão de três fatores: um mundo comoditizado, no qual é difícil distinguir um profissional do outro; relações de trabalho cada vez mais fluidas, com maior mobilidade entre empresas, geografias e, inclusive, de formatos de trabalho; e inteligência artificial nivelando o trabalho repetitivo e forçando ainda mais as pessoas a fazerem diferença nos processos para se tornarem relevantes.

“Navegar bem no futuro do trabalho vai depender dessa capacidade de ser percebido como alguém que faz diferença”, afirma. “Como as outras pessoas vão saber qual é o valor que você gera se você estiver escondendo do mundo as suas habilidades, seu repertório?”, questiona.

A marca pessoal, aliás, vai além do crachá que se carrega. “Ao longo da carreira um profissional pode trabalhar em várias empresas, mas o que permanece no transcorrer da vida corporativa é a sua marca pessoal, que é lapidada na construção da sua trajetória”, explica Luis Claudio Allan, CEO da People2Biz, agência de personal branding e business influencer marketing.

“Uma empresa é passageira na sua jornada profissional, mas você é permanente e sua marca pessoal é seu principal ativo que você irá levar para onde for. Então, se você não se pensa como uma marca, provavelmente irá perder oportunidades de evolução da sua carreira.”

Essência por trás da marca

Construir essa marca pessoal requer, antes de tudo, um autoconhecimento – para se ter claro o que se quer comunicar. Tanto é que especialistas em apoiar executivos na construção do chamado “personal branding” fazem, no começo do trabalho, um diagnóstico de persona.

“O branding pessoal deve ser o reflexo da essência de cada pessoa”, afirma Renata Zveibel, que trabalha com branding pessoal estratégico. “Não existe construção de personagem. Se vamos trabalhar com a essência, precisamos partir dos pilares básicos como valores, crenças, talentos natos.”

É a partir disso que se desenvolve a estratégia de posicionamento da marca pessoal para se chegar ao objetivo desejado. “Vamos definir qual é o recorte dessa essência que queremos compartilhar”, explica Zveibel.

Thiago Coelho, diretor geral da cervejaria Estrella Galícia no Brasil, diz que o processo mais importante para a construção do seu posicionamento foi se conhecer de forma mais clara e profunda. “Meus princípios, meus propósitos, minhas dores, minhas motivações.” Com mais de 80 mil seguidores no LinkedIn, Coelho posta frequentemente sobre temas que acredita serem mais relevantes para ele e para o seu público.

Thiago Coelho, diretor geral da cervejaria Estrella Galícia no Brasil (Arquivo Pessoal)

“Às vezes tem um ou outro post fora, mas 95% dos meus temas estão em três grandes grupos”, detalha. “Experiências que passei na minha carreira e o que aprendi com elas, que é o tema que tenho mais engajamento. Nesse caso eu reflito sobre os acontecimentos e aprendizados e transformo em uma história; igualdade de gênero e inclusão. Aqui tem temas quentes do momento, nos quais a agência [que o apoia] me ajuda a deixar no radar, e temas que eu mesmo experienciei durante a minha carreira; e Estrella Galícia, alinhado com o time de marketing e PR [relações públicas], definimos alguns posts que conectam com a minha história, com o público e com o negócio.”

Coelho afirma que ele mesmo escreve a maioria dos posts, “por conta do tema de genuinidade”. “Pessoas se conectam com pessoas através de histórias genuínas para temas que são relevantes para elas”, diz. Por isso, a dica dele para quem quer começar a criar sua marca pessoal e se expor nas redes sociais é definir claramente quem é você, seu posicionamento, e que mensagem quer passar.

Ainda que hoje Coelho tenha uma agência parceira que o apoia indicando alguns temas mais “quentes” que são importantes de serem comunicados e também na revisão dos textos, não foi assim desde o começo. Em 2019, quando ele decidiu que era a sua vez de “dar mais volume” para a sua voz em alguns temas e considerou que o LinkedIn era o melhor amplificador, começou o trabalho sozinho. “Na tentativa e erro e, em seguida, fui subindo o nível com apoio de profissionais, como consultoria de marca pessoal e consultoria de gestão do LinkedIn.”

Depois, ele diz, é preciso ter disciplina, consistência e persistência na produção e publicação dos conteúdos.

Allan, da People2Biz, pontua que para um executivo se destacar com a sua marca pessoal dentro do seu universo profissional é preciso trabalhar no desenvolvimento de uma narrativa que transmita um claro recado sobre quais são seus valores e como pode agregar valor para quem está contratando ou investindo em você.

“É importante que a sua marca transmita sua essência, e sua comunicação precisa ser humanizada e autêntica”, ensina. “Sua comunicação precisa ser única, personalizada, traduzindo para seu público o que você entrega, quais são suas áreas de conhecimento e seus talentos, como você se diferencia no seu mercado.”

CEO da companhia aérea Latam, Jerome Cadier começou a se posicionar publicamente no LinkedIn com o desejo de explicar o que é a Latam e como funciona o setor aéreo. “É um setor muito mal compreendido e ao mesmo tempo apaixonante”, diz. “Comecei a postar textos no LinkedIn para que as pessoas entendessem mais como as coisas funcionam, porque determinadas coisas acontecem na aviação, e como a Latam e eu encaramos esses desafios.”

Ele afirma que como escreve bem e se comunica de forma simples e transparente, foi tudo natural e verdadeiro. Aliás, “ser absolutamente verdadeiro” é a principal dica do CEO para quem está começando a trabalhar sua marca pessoal. “É muito claro quem tem conteúdo genuíno e quem não tem”, diz. “Estar exposto por tanto tempo e com frequência requer que o que se escreve seja 100% você.”

Jerome Cadier, CEO da companhia aérea Latam (Arquivo Pessoal)

Hoje, Cadier tem 110 mil seguidores no LinkedIn. Para ele, conhecer-se bem é necessário e ajuda muito para tudo, inclusive para se expor. Mas ele também acha que o caminho a trilhar pode ser descoberto por meio da experimentação, entendendo o tipo de reação por meio de comentários e repercussão de postagens e tipos de pessoas que seguem.

Nesse sentido, Giuliana Tranquilini, sócia da BetaFly Brandmakers e coautora do livro “Sua Marca Pessoal”, comenta que o “personal branding” é uma jornada, “um processo de identificar, comunicar e gerenciar a percepção que outras pessoas têm de você sem abrir mão da sua verdadeira identidade”. E complementa: “Quanto mais a pessoa se conhece, mais ela é capaz de escolher quais são os recortes que fazem sentido mostrar para seus públicos”.

Mesmo ocupando o cargo mais alto da hierarquia corporativa em uma das principais companhias aéreas do país, Cadier diz que ele mesmo escreve algumas das postagens, “os textos de assuntos mais pessoais ou polêmicos”, e comenta que a equipe o ajuda com textos mais corporativos e alinhados com o que a empresa está comunicando.

Dominar a arte do storytelling é essencial para ganhar um lugar ao sol. Afinal, todos têm muitas histórias interessantes em suas vidas pessoais e profissionais, mas quais são aquelas que valem a pena ser contadas dentro de determinados contextos profissionais? “É nesse desafio que uma boa estratégia de ‘personal branding’ faz toda a diferença: conectar talentos, histórias, objetivos de cada pessoa em um frame que direcione a exposição do profissional”, afirma Tranquilini.

E quando o profissional trabalha em uma organização, como Cadier e Coelho, isso é ainda mais relevante, diz a especialista. “O caminho deve ser alinhar essas duas marcas – a pessoal e a corporativa – em um ganha-ganha.”

Susana Arbex e Giuliana Tranquilini, sócias da BetaFly Brandmakers (Divulgação)

Construção de marca para profissionais autônomos

Mas a construção de uma marca pessoal forte também é importante para quem sai do mundo corporativo tradicional e segue uma carreira solo. No caso de Mariana Holanda, ex-diretora de saúde mental, diversidade e inclusão da Ambev, essa construção começou por acaso quando ela ainda estava na multinacional de bebidas, e ganhou força em sua trajetória como empreendedora.

“O começo da criação dessa marca pessoal aconteceu de uma forma um pouco inesperada, não muito calculada, que vem exatamente da minha função, por ser a primeira diretora de saúde mental do Brasil e da América Latina”, conta. “E eu usei muito disso quando eu fiz a minha transição de carreira, quando eu saí da Ambev. Eu construí minha marca a partir desse terreno fértil e me posicionei.”

Em 2019, a executiva foi diagnosticada com burnout. Na época, era head de gente e gestão da companhia. Ao retornar do período de afastamento, assumiu a diretoria de saúde mental. Mas, em 2021, decidiu deixar a empresa, e hoje é palestrante e mentora com foco em desenvolver e conectar pessoas através do autoconhecimento, de escolhas autoconscientes. É, ainda, conselheira da Conexa, da área de saúde. Nas redes sociais fala com frequência sobre o tema da saúde mental no ambiente corporativo. No LinkedIn sua audiência passa de 14 mil pessoas e no Instagram supera 12 mil seguidores.

“Eu acho que o começo dessa criação de marca [pessoal] teve muito esse alicerce [de ter trabalhado como diretora de saúde mental em uma grande empresa], nessa prerrogativa de ser a primeira pessoa, de realmente começar essa temática no setor privado, alinhando muito toda essa conexão com o meu adoecimento”, lembra.

A temática das postagens de Holanda, no entanto, vai mudando com o passar do tempo. “Eu tento me concentrar bastante em questões relativas à saúde mental, mas fora isso eu produzo conteúdo a partir do que eu estou aprendendo, estudando, lendo também, de insights que eu tenho”, explica.

Ainda no começo de sua jornada de criação de marca pessoal, Luciana Lancerotti, ex-CMO da Microsoft, diz que fez um mergulho interno de autoconhecimento ainda mais profundo para começar a se posicionar publicamente. Contou com a ajuda de uma profissional de “personal branding” para isso.

“Fui revisitar a minha essência para ter certeza de quais eram os caminhos que eu queria trilhar, do que eu acredito que é minha missão verdadeira, qual é o meu lugar de fala, onde eu posso impactar positivamente trazendo todo o conhecimento que eu adquiri nesses quase 50 anos de vida”, conta.

A construção dessa marca está alinhada com a carreira solo que Lancerotti trilha desde o final de 2023. Além de conselheira, professora e mentora, ela fundou uma empresa de gestão de design e impacto. “O meu trabalho exige o entendimento de uma necessidade ou problema que a empresa ou audiência deseja solucionar, principalmente orientado para práticas de sustentabilidade”, explica. “[Consiste em] identificar o problema, desenhar a lógica, aplicar o conceito e mensurar o impacto.”

Com mais de 10 mil seguidores no LinkedIn, ela foca suas postagens em mensagens simples e que possam ajudar as pessoas para uma vida mais sustentável em diferentes aspectos. “Agora, é dedicar tempo para preparar conteúdo, correr atrás de clientes de consultoria e fazer palestras.”

O passo a passo do personal branding

1. Autoconhecimento

Entenda profundamente seus valores, habilidades e objetivos. O primeiro passo para construir uma marca pessoal forte é olhar para dentro e refletir sobre quem você é e o que você representa. Pergunte a si mesmo: Quais são meus pontos fortes? Quais são meus valores fundamentais? O que eu quero alcançar na minha carreira? Esse autoconhecimento permitirá que você crie uma marca autêntica e alinhada com seus verdadeiros objetivos e princípios.

2. Definição de marca

Defina seu DNA da marca, identificando o que torna você único. Após o autoconhecimento, o próximo passo é traduzir isso em uma identidade de marca clara. Pense em como você quer ser visto pelos outros e quais são os atributos únicos que você traz para o mercado. Sua marca deve refletir suas competências, suas paixões e a maneira como você pode agregar valor aos outros. Essa definição é essencial para criar uma base sólida para sua marca pessoal.

3. Posicionamento

Identifique seu público-alvo e como você deseja ser percebido no mercado. Saber quem você está tentando alcançar é crucial. Pesquise e entenda as necessidades e expectativas do seu público-alvo. Posicione-se de forma a atender essas necessidades de maneira única. O posicionamento envolve comunicar de forma clara como você se diferencia dos demais e porque as pessoas devem escolher trabalhar com você.

4. Estratégia de comunicação

Desenvolva uma estratégia de comunicação que seja autêntica e consistente, abrangendo tanto a comunicação online quanto offline. Sua comunicação deve refletir sua marca pessoal em todas as plataformas e interações. Isso inclui postagens nas redes sociais, participações em eventos, artigos publicados e interações cotidianas. Certifique-se de que sua mensagem seja clara e consistente, e que ressoe com seu público-alvo. A autenticidade é a chave—seja verdadeiro sobre quem você é e o que você representa.

5. Feedback

Busque feedback constantemente e esteja disposto a ajustar sua estratégia conforme necessário. O processo de fortalecer uma marca pessoal é contínuo e interativo. Em marca pessoal vivemos em um eterno rebranding, sempre em evolução, mas nunca nos perdendo de nós mesmos.

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